A UE e a regeneração dos portos

A União Europeia (UE) reconhece a importância vital dos portos fluviais e marítimos para o comércio e a economia dos seus Estados-Membros. Com uma visão estratégica para 2030, a UE está comprometida em contribuir significativamente para a regeneração e sustentabilidade destas infraestruturas essenciais.

Os portos são pontos nevrálgicos para o comércio, com 74% do comércio externo de mercadorias da UE e 37% do tráfego intra-UE de mercadorias a passarem por eles. Além disso, são responsáveis por um impacto económico significativo, contribuindo diretamente para o emprego, o investimento interno e o crescimento do PIB.

A estratégia da UE para os portos inclui uma série de medidas que visam não só a regeneração física das infraestruturas, mas também a melhoria do desempenho ambiental. A proposta prevê uma maior flexibilidade para se ter em conta o desempenho ambiental dos portos, incentivando a utilização de tecnologias ecológicas nos navios e nas infraestruturas portuárias.

Além disso, a UE está atenta aos desafios ambientais enfrentados pelo setor marítimo. Um relatório da Agência Europeia do Ambiente destaca os progressos realizados no sentido da sustentabilidade e sublinha a necessidade de mais esforços para preparar a procura crescente e garantir o bem-estar dos ecossistemas e zonas costeiras.

A Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030 de Portugal, por exemplo, reflete o compromisso da UE com a gestão sustentável dos seus recursos marítimos, que constituem uma parte significativa das águas marinhas sob jurisdição dos Estados-Membros da UE.

Em suma, a UE está a tomar medidas proativas para assegurar que os portos fluviais e marítimos dos países membros sejam regenerados de forma sustentável, contribuindo para o crescimento económico e a criação de emprego, ao mesmo tempo que se protege o ambiente e se promove a sustentabilidade a longo prazo.

Uma cor­re­ção cli­má­tica chega por bar­caça
Para redu­zir as emis­sões de car­bono nas auto-estra­das, a Europa está a recor­rer a uma solu­ção cen­te­ná­ria
POR LIZ ALDERMAN · 30 mar 2024

Enquanto a luz pálida da manhã tre­me­lu­zia pelo Sena, o Capi­tão Freddy Badar diri­gia a sua enorme bar­caça flu­vial, Le Bosphore, pas­sando por pito­res­cas aldeias da Nor­man­dia e bos­ques cer­ca­dos de neve, esta­be­le­cendo um curso para Paris.
A bordo esta­vam con­ten­to­res cheios de mobi­li­á­rio, elec­tró­nica e ves­tu­á­rio car­re­ga­dos na noite ante­rior de um car­gueiro que atra­cara em Le Havre, o porto marí­timo do Norte de França.
Se a carga con­ti­nu­asse por estrada, 120 cami­ões teriam obs­tru­ído as auto-estra­das. A uti­li­za­ção do Le Bosphore e da sua tri­pu­la­ção de qua­tro pes­soas impe­diu a entrada de tone­la­das de emis­sões de car­bono na atmos­fera.
“O rio é parte de uma solu­ção mais ampla para um trans­porte mais limpo e o meio ambi­ente”, disse o Capi­tão Badar, com os olhos exa­mi­nando outros navios que trans­por­tam mer­ca­do­rias para cima e para baixo do Sena. “Mas há muito mais que pode­rí­a­mos estar fazendo.”
À medida que a União Euro­peia inten­si­fica a sua bata­lha con­tra as alte­ra­ções cli­má­ti­cas, tem de des­car­bo­ni­zar o trans­porte de mer­ca­do­rias, res­pon­sá­vel por um quarto das emis­sões glo­bais de gases com efeito de estufa.
Para lá che­gar, volta-se para uma solu­ção cen­te­ná­ria: os seus rios. Com 23.000 milhas (37.000 qui­lô­me­tros) de vias nave­gá­veis que abran­gem a União Euro­peia, as auto­ri­da­des vêem um enorme poten­cial para aju­dar a levar cami­nhões — A maior fonte de emis­sões de frete — para fora das estra­das. O acordo Verde Euro­peu, o plano de des­car­bo­ni­za­ção da União Euro­peia, trans­for­ma­ria os rios em auto-estra­das e dupli­ca­ria o trá­fego de bar­ca­ças até 2050.
Há muito espaço para melho­rias. Actu­al­mente, os rios trans­por­tam menos de 2% do frete da Europa. Em com­pa­ra­ção, cerca de 6,5 milhões de cami­ões atra­ves­sam as estra­das da Europa, repre­sen­tando 80% do trans­porte de mer­ca­do­rias. Os cami­nhos-de-ferro repre­sen­tam cerca de 5%.
Para que os rios movi­men­tem mais trá­fego, grande parte da infra-estru­tura flu­vial da Europa, com déca­das de exis­tên­cia, inclu­indo por­tos e eclu­sas, terá de ser melho­rada. Um pla­neta em aque­ci­mento con­tri­bui para o Desa­fio: as secas dos últi­mos anos ater­ra­ram alguns trans­por­tes no Reno e repre­sen­tam ris­cos para o Sena.
Embora o Sena não seja o rio mais tra­fi­cado da Europa — ou seja, o Reno, que atra­vessa a Ale­ma­nha e os Paí­ses Bai­xos—, a ambi­ção é trans­formá-lo num dos prin­ci­pais cen­tros expe­ri­men­tais para a tran­si­ção cli­má­tica.
“Esta­mos a tra­ba­lhar numa trans­for­ma­ção para fazer com que as empre­sas mudem mas­si­va­mente as suas rotas logís­ti­cas”, disse St,
o pre­si­dente do prin­ci­pal ope­ra­dor por­tu­á­rio de França, Haropa, que está a inves­tir mais de 1 mil milhões de euros (ou 1,1 mil milhões de dóla­res) no esforço do Sena.
ATRAIR TRÁFEGO PARA O RIO
Antes de Par­tir De Le Havre para Paris, quando uma forte neve caiu no escuro, a tri­pu­la­ção do Le Bosphere emba­lou os con­têi­ne­res fir­me­mente no porão de carga, veri­fi­cando um mani­festo enquanto um guin­daste de pór­tico balan­çava sobre a cabeça.
Le Bosphore, parte de uma frota de 110 bar­ca­ças admi­nis­trada pela Soges­tran, A maior empresa de trans­porte flu­vial da França, seguirá para Gen­ne­vil­li­ers, um porto a cinco milhas de Paris que é um cen­tro de dis­tri­bui­ção para os 12 milhões de con­su­mi­do­res da região da capi­tal. A via­gem levará cerca de 30 horas.
O Sena pode trans­por­tar muito mais bar­ca­ças como o Le Bosphore, que é mais longo do que um campo de fute­bol e eco­no­miza 18.000 via­gens de cami­nhão por ano entre Le Havre e Paris. O governo espera atrair qua­tro vezes mais carga para o rio do que as 20 milhões de tone­la­das métri­cas que lida agora a cada ano.
Para o con­se­guir, a Haropa tem vindo a ace­le­rar a expan­são do porto de Le Havre, que fica na foz do Sena, numa ten­ta­tiva de atrair navios dos por­tos mai­o­res de Roter­dão, nos paí­ses bai­xos, ou de Antu­ér­pia, na Bél­gica. A carga depo­si­tada nes­ses por­tos é então trans­por­tada para França em cami­ões.
Em seus outros cinco ter­mi­nais por­tu­á­rios no Sena, Haropa está adi­ci­o­nando esta­ções elé­tri­cas que per­mi­tem que os navios se conec­tem enquanto anco­ra­dos, em vez de ope­rar moto­res.
Embora grande parte da frota de bar­ca­ças da Europa ainda seja movida a die­sel, uma pequena mas cres­cente parte está sendo adap­tada para bio­com­bus­tí­veis. Bar­cos elé­tri­cos estão che­gando ao mer­cado. Estão tam­bém a ser desen­vol­vi­dos pro­tó­ti­pos de bar­ca­ças movi­das a hidrogé­nio.
Empre­sas como a Ikea e as start-ups de trans­por­tes flu­vi­ais estão a aju­dar a impul­si­o­nar o movi­mento. Eles estão desen­vol­vendo ser­vi­ços de entrega de última milha sem car­bono para atrair os con­su­mi­do­res — e para se ante­ci­par às rígi­das regras ambi­en­tais que as cida­des euro­peias estão impondo para limi­tar veí­cu­los pesa­dos e polu­en­tes.
UMA CADEIA DE”TRANSPORTES MAIS LIMPOS”
Oito horas depois de nave­gar de Le Havre, Le Bosphore parou em Rouen, uma grande parada para carga flu­vial de e para Paris. Por volta das 10h, uma nova tri­pu­la­ção de qua­tro pes­soas, lide­rada pelo Capi­tão Badar, embar­cou para um turno de uma semana, e a via­gem para Paris foi reto­mada.
O trá­fego de bar­ca­ças no Sena aumen­tou ape­nas 5% em rela­ção a uma década atrás. Enquanto o governo está ten­tando pro­je­tar uma ace­le­ra­ção,” os rios foram negli­gen­ci­a­dos por muito tempo”, disse o Capi­tão Badar, a ter­ceira gera­ção de capi­tães de bar­cos flu­vi­ais de sua famí­lia.
Ele está entre uma raça rara. Mui­tos capi­tães de bar­cos flu­vi­ais na Europa estão a apro­xi­mar-se da Idade da reforma e há uma escas­sez de pes­soal qua­li­fi­cado, um pro­blema que corre o risco de tra­var o cres­ci­mento espe­rado do trá­fego flu­vial.
Durante sécu­los, obser­vou o Capi­tão Badar, os rios eram pra­ti­ca­mente a única maneira de trans­por­tar mer­ca­do­rias pela França: o antigo sím­bolo de Paris é um barco. Mas as vias nave­gá­veis caí­ram em desuso quando cami­nhões e trens domi­na­ram o trans­porte no século 20, espe­ci­al­mente após a Segunda Guerra Mun­dial, quando as rodo­vias e fer­ro­vias se expan­di­ram por todo o con­ti­nente.
Os gover­nos apoiam essas indús­trias” por­que têm lob­bies e sin­di­ca­tos pode­ro­sos”, disse o Capi­tão Badar, pas­sando por um cas­telo medi­e­val cons­tru­ído por Ricardo Cora­ção de Leão enquanto o sol ilu­mi­nava o céu da tarde.
“Agora esta­mos come­çando a falar sobre o meio ambi­ente, e seria melhor ver o rio como parte de uma cadeia mais ampla de trans­porte mais limpo.”
ARMÁRIOS E GRÃOS DE CAFÉ
Le Bosphore desem­bar­cou no porto de Gen­ne­vil­li­ers na manhã segu­inte, antes do ama­nhe­cer, atra­cando ao lado de outras bar­ca­ças car­re­ga­das de mer­ca­do­rias para empre­sas pari­si­en­ses. Uma grua des­car­re­gou três cama­das de con­ten­to­res do porão, colo­cando-os no cais, onde empi­lha­do­res os empi­lha­ram para o lado. Ape­sar da carga volu­mosa, o Le Bosphore con­su­miu o com­bus­tí­vel de ape­nas cerca de qua­tro cami­ões em toda a sua via­gem.
Do outro lado do Porto, estava em curso uma expe­ri­ên­cia para tor­nar a última milha de entrega mais amiga do ambi­ente: um arma­zém gigan­tesco, cri­ado num acordo de 2022 entre a Haropa e a Ikea, a gigante sueca do mobi­li­á­rio, para criar uma forma neu­tra em car­bono de entre­gar mer­ca­do­rias uti­li­zando o Sena.
Pale­tes emba­la­dos com armá­rios de cozi­nha e sofás Ikea, enco­men­da­dos on-line menos de 48 horas antes, foram car­re­ga­dos em uma bar­caça que os leva­ria ao cen­tro de Paris. Lá, eles seriam colo­ca­dos em cami­nhões elé­tri­cos e entre­gues aos cli­en­tes.
O pro­cesso não está com­ple­ta­mente des­car­bo­ni­zado, mas o acordo per­mi­tiu à Ikea reti­rar o equi­va­lente a 6.000 cami­ões das ruas de Paris no ano pas­sado, disse Emi­lie Car­pels, direc­tora do pro­jecto River da Ikea.
Outros empre­en­di­men­tos pre­ten­dem ser mais ino­va­do­res.
A pri­meira bar­caça flu­vial movida a hidro­gê­nio da Europa, a Zulu, deve come­çar a ope­rar na pri­ma­vera. Pro­je­tado por Soges­tran, pode trans­por­tar até 320 tone­la­das métri­cas, ou o con­te­údo de cerca de 15 cami­nhões. “Esta­mos nos movendo em dire­ção a um futuro de trans­porte cada vez mais limpo”, disse Flo­rian Leva­rey, dire­tor do pro­jeto.
Para a Flu­dis, uma start-up Fran­cesa, esse futuro já está pró­ximo. Seu pre­si­dente, Gil­les Manu­elle, fun­dou a empresa em torno de dois bar­cos que fun­ci­o­nam com bate­rias elé­tri­cas e uma frota de bici­cle­tas elé­tri­cas.
Por volta da 7 numa manhã recente, uma dúzia de tri­pu­lan­tes car­re­gou uma das peque­nas bar­ca­ças com cai­xas de grãos de café, Papel de foto­co­pi­a­dora, Toa­lhas de cozi­nha e outros bens a serem entre­gues a bis­trôs e empre­sas fran­ce­sas. Enquanto o barco pas­sava silen­ci­o­sa­mente pelo Lou­vre para sua pri­meira des­cida, os tra­ba­lha­do­res a bordo car­re­ga­vam suas bici­cle­tas com ordens e cor­riam para as ruas assim que o capi­tão atra­cava.
“Esta­mos come­çando peque­nos”, disse Manu­elle. “Mas são peque­nas solu­ções como esta que podem cres­cer muito mais e aju­dar a desem­pe­nhar um papel na rever­são do aque­ci­mento glo­bal.”
De volta a Gen­ne­vil­li­ers, a tri­pu­la­ção do Le Bosphore encheu o porão agora vazio com pro­du­tos fran­ce­ses para expor­ta­ção: fari­nha, madeira ser­rada, bol­sas de luxo e cham­pa­nhe. Por volta das 2 da tarde, come­ça­ria um cru­zeiro de volta a Le Havre, onde a tri­pu­la­ção des­car­re­ga­ria e depois Come­ça­ria tudo de novo.
“Eu sei há muito tempo que o rio era o meio de trans­porte mais eco­ló­gico”, disse o Capi­tão Badar, vol­tando ao leme. “Agora pre­ci­sa­mos que os for­mu­la­do­res de polí­ti­cas real­mente façam isso acon­te­cer”, acres­cen­tou. “O poten­cial é enorme.”
Le Bosphore, uma bar­caça flu­vial, eco­no­miza 18.000 via­gens de cami­nhão por ano entre Le Havre e Paris.

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